 | |
Foto: Marisa Cauduro/Arquivo |
O mundo perdeu um dos seus gigantes das letras: o peruano Mario Vargas Llosa, que ultraou fronteiras com suas histrias e ganhou o Prmio Nobel de Literatura em 2010, morreu no ltimo domingo (13), em seu pas natal, na capital Lima, aos 89 anos. A informao foi anunciada pelas redes sociais por seu filho, lvaro Vargas Llosa.
Dono de uma obra vastssima e influente, ele encerrou sua vida longe dos holofotes, mas seu legado permanece como um dos pilares da literatura latino-americana. Ele era o ltimo representante vivo de uma era de ouro, ao lado de outros grandes nomes como o colombiano Gabriel Garca Mrquez, o argentino Julio Cortzar e os mexicanos Carlos Fuentes e Juan Rulf.
Para Lourival Holanda, presidente da Academia Pernambucana de Letras (APL), a morte de Vargas Llosa no apaga o que seu trabalho eternizou. “Ns, da literatura, somos um povo, uma entidade muito diferente. Celebramos at mesmo as despedidas. Mario Vargas Llosa e sempre ser uma referncia”, afirma em conversa exclusiva com o Viver. “Nunca deixaremos de reconhecer sua qualidade literria e a sensibilidade que tinha para a linguagem”, exalta o escritor pernambucano.
Nascido em uma famlia de classe mdia em Arequipa, no sul do Peru, em 28 de maro de 1936, o autor teve na Academia Militar de Lima seu primeiro choque com o realismo social peruano. A convivncia forada entre jovens de todas as classes e raas – e a violncia que da emergia – cristalizou seu desejo de ser escritor. Aos 26 anos, transformaria essa experincia em A Cidade e os Cachorros (1963), ttulo que j revelava seu dom de elevar as particularidades peruanas condio de literatura universal.
Se este romance o projetou fama, Conversa no Catedral (1969) consolidou de vez seu prestgio como mestre da narrativa. A partir da, sua produo literria fluiu de forma ininterrupta — como prometeu que faria “at o ltimo dia de sua vida”. Obras como Pantaleo e as Visitadoras, Tia Julia e o Escrevinhador e A Festa do Bode foram somando novas camadas a um legado monumental: 20 romances, dez peas teatrais, 14 ensaios, alm de contos e crnicas que atravessam sete dcadas de produo incessante.
Depois de desvendar as crises polticas e sociais do Peru, Vargas Llosa voltou seu olhar para os eternos conflitos entre as classes marginalizadas e as elites econmicas que se repetiam em toda a Amrica Latina. Fascinado por Os Sertes, clssico de Euclides da Cunha, o autor peruano recriou com maestria o trgico embate entre o Exrcito brasileiro e os seguidores de Antnio Conselheiro em A Guerra do Fim do Mundo (1981). Neste romance, considerado um dos seus trabalhos mais poderosos, Vargas Llosa transcendeu o fato histrico para construir uma alegoria universal sobre fanatismo, poder e resistncia.
Aos 74 anos, quando recebeu o Nobel por mapear “o poder e a resistncia humana”, ele poderia ter considerado encerrado o seu ciclo de reconhecimentos. Engano. Treze anos depois, o escritor que tornou o espanhol uma lngua literria universal surpreenderia o mundo ao ocupar a cadeira 18 da Academia sa — instituio que, em quatro sculos, nunca havia imortalizado algum que no escrevesse em francs. O autor peruano ensinou que palavras so armas de resistncia, e por isso seguir vivo em cada linha que deixou.