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| Robert Pattinson brilha interpretando duas verses de si mesmo na fico cientfica (Warner/Divulgao) |
difcil imaginar o tamanho da presso sobre algum que acaba de produzir um dos maiores sucessos da histria. O diretor sul-coreano Bong Joon-ho um desses casos, consagrado por Parasita, divisor de guas do cinema contemporneo e primeiro vencedor do Oscar de Melhor Filme falado em lngua no-inglesa. natural que seu projeto seguinte tenha criado uma onda de expectativas impossvel de ser totalmente cumprida e, em cartaz no Recife aps uma srie de adiamentos, Mickey 17 j comea a sofrer esse peso — ainda que, de maneira isolada, no decepcione.
Baseado no livro Mickey7, de Edward Ashton, a fico cientfica gira em torno do personagem-ttulo, que se inscreve para um programa de clonagem em uma misso espacial de colonizao de um planeta hostil habitado por criaturas rastejantes. Tratado como cobaia pela companhia que lidera a expedio e colocado nas mais absurdas situaes, Mickey assina um contrato para “morrer” quantas vezes for necessrio, enquanto suas memrias so armazenadas e seu corpo reimpresso.
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| (Warner/Divulgao) |
A obra de Bong Joon-ho j era ntima do mercado ocidental muito antes de Parasita. Filmes como Memrias de um Assassino e O Hospedeiro se tornaram marcos da filmografia sul-coreana, que comeava a crescer fortemente nos anos 2000, enquanto Expresso do Amanh e Okja, falados em ingls e com atores hollywoodianos, foram amplamente conhecidos pelas mudanas de tom, pela acidez no senso de humor e pela ousadia narrativa. Mickey 17, portanto, no um corpo estranho para o cinema de Bong e tampouco para o mainstream norte-americano.
Apesar do oramento estimado em 120 milhes de dlares — valor arriscado para um projeto no suficientemente popular e que se baseia essencialmente no peso dos nomes envolvidos para angariar resultado —, esse filme tem uma encenao at mais contida e econmica do que os outros trabalhos em lngua inglesa de Bong. E como o desenrolar da narrativa segue batidas tradicionais que vo de Star Wars a Tropas Estelares, frequentemente o roteiro parece conflitante entre se entregar a uma abordagem mais radical em seus absurdos ou traar uma dinmica dramtica bastante familiar (o que acaba prevalecendo).
Robert Pattinson (e seu duplicado) se torna, nesse meio termo, o grande ponto de equilbrio de Mickey 17. Ator j estabelecido pela sua versatilidade e cuja filmografia recente dialoga desde o blockbuster srio (Batman) at o terror indie autoral (O Farol), ele empresta sua disposio fsica propensa ao deboche quando o filme precisa desse registro caricato, ao o que seu olhar penetrante e intensidade silenciosa imprimem constantemente uma atmosfera de profundidade que o roteiro no necessariamente carrega.
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| (Warner/Divulgao) |
Naomi Ackie central na humanizao do conceito e faz um par (ou trio) excelente com Pattinson, enquanto Mark Ruffalo e Toni Collette representam o que h de tipicamente exagerado e fanfarro no trabalho de Bong, no muito diferentes do que Jake Gyllenhaal e Tilda Swinton fizeram no brutalOkja.
Os temas dele esto todos l: as discusses de classe, a stira poltica, a urgncia da pauta ambiental e os perigos da tecnologia utilizada para fins autoritrios e imperialistas. Esto presentes tambm o humor absurdista e a ocasional crueldade da violncia, ainda que, em funo das amarras do alto custo de produo, estejam bem mais diludos e palatveis do que em seus projetos autorais.
Fica a impresso de que Bong abraou um trabalho mais convencional exatamente para escapar da sombra projetada pelo estouro no Oscar 2020. E bem prazeroso ver que, at brincando de sci-fi com tiranos e criaturas fofas, ele mantm uma cara prpria.
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